5 de jul. de 2013

O chamado da fé; ou: fora da zona de conforto.

O chamado da fé; ou: fora da zona de conforto.



Já havia em mim a inspiração de escrever a respeito, e com a publicação da encíclica Lumen Fidei, em particular a primeira parte do primeiro capítulo a catequese: Abraão nosso pai na fé. A chama da fé já me suscitou colocar para fora a inspiração latente. Que Deus me acompanhe nas próximas palavras.

Qual a diferença entre a vida de um santo - de alguém cuja vida seja heróica nos caminhos da peregrinação terrena - e de um cristão comum? Responde-nos nosso pai na fé, Abraão.

A resposta é a fé! E como nos fala a encíclica a fé não é um salto no escuro, mas a certeza, na confiança, de que Deus fará! A História de Abraão nos responde como tudo se dá. A primeira etapa foi escutar a voz de Deus, ou seja, permitir-se ouvir em contraponto a querer ser ouvido; depois despojar-se das seguranças, da comodidade; para só então acontecer o desejo do coração de Abraão. Pode parecer injusto que seja assim, mas isso acontece por amor e pela dureza do coração de cada um, pois em nossa visão turva não enxergamos as conseqüências de atos mal planejados e mal executados, temos a tortuosa inclinação ao imediatismo.

Primeiro, é preciso ouvir a Deus para compreender, na maior fonte primária, os motivos de nossa inquietude e anseios. Ele nos conhece por inteiro e sonda nosso profundo interior (Salmo 139). Enxergamos nosso desejo como a ponta de um iceberg o qual esconde sua maior parte imersa em águas geladas. Deus compreende bem nossas necessidades e tudo aquilo que pode ser bom para nós, assim ao ouvir sua voz pode-se ter a orientação completa a seguir e não apenas meios incompletos.

Segundo, é estar disposto a despojar-se daquilo que nos prende no mesmo lugar. Deus falou a Abraão para sair de sua terra e pôr-se a caminhar, ou seja, tirou suas falsas seguranças para libertá-lo de sua própria prisão. Aqui se dá uma das grandes diferenças de nossa pergunta, não estamos dispostos a abandonar certas coisas, e, aqui se encontra o ponto chave da conversão. A palavra é: obediência! Ouvir a Deus não é tão difícil, mas é difícil abandonar certos hábitos, certas “verdades”, aceitar e obedecer à voz de Deus. Muitas vezes nos convencemos da seguinte frase: “Eu acredito e aceito isso, mas isso eu não aceito.”, com o intuito de não querer se por em movimento, mas a vida em direção ao céu não é estática, é dinâmica. Neste ponto se encontra a zona de conforto, um local cômodo em que construímos uma fortaleza intransponível. Cria-se novamente a falsa segurança. Já o santo não se contenta com seguranças terrenas. A segurança verdadeira só existe no pós-morte, na ressurreição, quando já alcançou o céu pela misericórdia divina. Até chegar o céu a caminhada deve ser constante ou corremos o risco de assim como Moisés chegar às portas da terra prometida e não poder entrar.

Por fim, depois de tudo isso é que faz o coração aquecer toda àquela água gelada que o rodeava ao ponto daquele desejo obscuro ser iluminado pela fé e só então se alinhar perfeitamente ao desejo de Deus. Quanto amor!




Vejo-me em muitas vezes estagnado na fé ou vivendo um grande tempo de aridez, não é a princípio algo alarmante ou temerário, pois em toda vida existem os momentos de desertos. Entretanto, não deve esse tempo ser tratado com leviandade. Há um imperativo que me obriga a não conformar-me com uma vida medíocre ou demasiadamente seca e vazia: “Sede santos, assim como vosso Pai celeste é Santo.” (Mt 5, 48).

É recorrente ver pessoas cristãs reclamarem sobre suas vidas sem nem refletir sobre a reclamação ou sobre sua postura diante do pedido. São pessoas de vivências variadas: uns vivem apenas da missa aos domingos; outros têm uma extrema dificuldade de se dedicarem; outros, ainda, têm a extrema facilidade de se dedicarem a um grupo, movimento, ou qualquer outra denominação; alguns têm uma vida de oração constante, vão à missa, lêem a bíblia, rezam o terço diariamente; e tantos outros em tantas outras situações. Em todas as situações encontramos pessoas que se queixam, murmuram freqüentemente, e muitas entram em crises de fé profundas chegando até a questionar a existência ou bondade de Deus. São coisas muito comuns e não me excluo do grupo, pelo contrário, a reflexão parte de mim para fora, sempre em busca da minha conversão e do cumprimento do desejo de Deus em minha vida.
Em regra o modelo é assim: “Senhor, eu quero ‘isso’. E que seja ‘assim’, ‘assim’, e ‘assim’.” E se aplica a quase tudo, é só substituir o “isso” pelo pedido e os “assim” pelos aspectos que o pedido, para ser realizado, deve conter. Resumindo: “Senhor, entra na minha casa, entra na minha vida. Faz uma linda reforma, mas não mexe nas estruturas e nem nas paredes que eu quero que permaneçam em pé”. As dificuldades de se aprender com a catequese de Abraão não se aplica apenas aos afastados da Igreja, mas também aos mais freqüentes e dedicados. Não estamos imunes! Se for honesto consigo mesmo irá perceber quais são suas seguranças e quais são os pontos que precisam de conversão, de despojamento, de largar e se por a caminho. Eis a diferença! Os santos não se cansam de obedecer a voz de Deus, isso os sustenta, isso os impulsiona a estarem de pé e em movimento constante.




Portanto, a fé, a esperança e a caridade são virtudes necessárias na vida de todo cristão. É preciso aprender com nosso pai Abraão a ouvir a voz de Deus e obedecê-lo. Ele nos sustentará e nos humanizará, retirando de nós todos os aspectos que nos tornam selvagens em um reino perdido. Escutar e responder ao chamado da fé nos tira da zona de conforto e nos coloca a caminhar rumo à terra prometida. Cristo é a Palavra encarnada, que a Palavra se torne carne em nossos corações, a fim de cumprirmos àquele imperativo à luz da fé: “Sede santos, assim como vosso Pai celeste é Santo.”.


R. B. Figueiredo